segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Escritos para um dia de vôo

Vou escrever isso em menos tempo do que me cabe. Ou do que cabe para o momento. Mas é isso que os momentos costumam fazer, fazem coisas serem escritas assim na pressa, sem que tenham tempo aonde caibam.

Queria ter ido na despedida de vocês, eu sei, não deu, e na verdade minha vida tem sido ultimamente pouco mais que uma seqüência interminável de despedidas, como se os abraços, beijos, os me-escreva ou me-liga, os espera-que-eu-não-quero-chorar e os droga-já-estou-chorando nunca me fossem suficientes. Não que tenha sido essa a razão por eu não ter ido nas últimas despedidas, sei que não fui porque não deu.

Mas também não deu pra despedir de ninguém. Parece que nenhum até-logo é longo o suficiente para durar seis meses, e que os adeus são muito pouco curtos para não serem para tempo demais. Não consegui achar meio termo, um adeus-breve, ou já-volto-muito-tarde. Falta palavra e isso é chato.

De vocês na verdade não me despeço. É estranho, vocês são meio que um mundo paralelo meu, onde enquanto tudo ficava para trás com minhas seqüëncias de até-breves e tchaus, com vocês eu só dizia oi e olás e como-vais e até-daqui-a-poucos. Vocês são aquilo que fica, e é bom que algo fique, e que sejam vocês, essa coisa meio you-say-goodbye-and-i-say-hello a la beatles.

E a questão agora é pensar naquilo que fica, que é o que não vai. Estou com a mala aberta aqui na minha frente e a questão é a pequenitude das malas, que alguém fez pequenas demais para não serem levadas a sério. São só levadas, com o sério dentro, e depois dele pouca coisa cabe. Cabe umas roupas, uma camisa azul que é meio nova sim mas a outra rasgada que estava pensando em costurar vai acabar ficando por aqui mesmo. E é estranho olhar para essas coisas desistidas. Quando o armário, as estantes, e todos esses depósitos de resíduos da eternidade de nós mesmos ficam ainda. Com tanto. E nós levando tão pouco. O livro que vem, e o deveria vir mas lembrei que não é meu e tenho que devolver, porque sim, tem coisas que não podem esperar que a gente volte. O livro já foi, e outras coisas também vão. De tudo fica um pouco, mas um pouco também vai, e é porque tem que ir.

Então entre o que fica e o que vai, o que eu mando são meus exageros e meus dramas que não pensem que não são também de ansiedade e de olhos fitando o horizonte desesperadamente de minuto a minuto sabendo que a qualquer instante eu vou parar de reconhecê-lo e ele vai ser aquela linha tão horizontal como sempre foi, mas absurdamente diferente. E que isso vai ser fantástico. E que vou me apaixonar pelos nomes de cada rua de cada esquina e bairro onde estarei completamente perdido até o dia em que vou saber das estradas que se cruzam e das mãos que tem contra-mãos, e que ali é o Tejo e não do outro lado como eu achava que era. E que quando eu for voltar, o que vai ficar é o lá que ainda nem veio.

Mas tinha que escrever, e tinha que ser desse jeito, porque acho que só assim eu vou sentir que algo está acontecendo. Porque até acontecer, estarei meio que anestesiado demais para perceber que o que está por vir é qualquer coisa de diferente do que é uma segunda-feira ou uma terça, e que o amanhã não cabe no vocabulário dos dias-da-semana.

"The only baggage you can bring is all that you can't leave behind". U2 (ok, ok, antropólogos não costumam citar U2, mas aqui não teve jeito. vou ver se cito o malinowski da próxima vez...)

Abraço
...e até daqui a pouco: Rhaul, Lucas, Mara, Isabela (que já está lá), Nadja (que também), Thiago e Dani (que vão comigo), Deivison (futuro vizinho), Gabriela, e outros tantos que por ora só conheço por etcetra.

Rafael (Lasevitz)

(meu vôo parte de Brasília para Lisboa pela TAP nesta segunda, dia 10, às 17h55).

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